Olhava atordoada para o telefone, não imaginava que depois de tanto tempo ele ainda lembraria seu número, muito menos que sentiria vontade de ouvir sua voz novamente. A conversa foi breve, muitas pausas, e um enorme receio de que voltassem a falar do passado distante. Cinco anos voltaram como cenas de filme. Parecia que tudo aconteceu em questão de meses atrás. Vozes trêmulas e um medo de que nos dias seguintes voltassem a se ver. Tudo parecia uma brincadeira do destino.
Lia voltou a tomar seu café, porém agora possuía um gosto de passado, forte, amargo e frio. Não conseguia entender. Quem poderia ter passado seu número a ele? Desde que deixaram de se ver, ela sonhava acordada com esse dia, mas depois de cinco anos os sonhos já não são mais os mesmos, os gostos mudam de sabor, e até as manias se tornam ‘manias de adulto’. Ela havia crescido, e junto com ela, tudo ao seu redor mudara. A casa já não era mais a mesma, os móveis foram trocados faz uns três anos, e os bichos de pelúcia que ficavam em cima da cama, hoje ganharam um lugar privilegiado com vista do alto do quarto, ficavam em cima do guarda-roupa, num saco de plástico, no qual sua mãe havia separado pra doar. Mas a vontade de voltar a ser a menininha que antes era a impediu de levar embora tais companheiros de aventuras. Hoje já não era mais aquela doce menina que acreditava nas fadas e na misticidade da vida. Tudo perdera o encanto quando teve sua primeira lágrima de amor.
Ainda sentada em sua sala, com sua xícara de café frio nas mãos e o telefone a encarando na mesinha do canto, tentava entender como ele havia passado os últimos cinco anos. O que aconteceu com ele? Será que alguém o fez sofrer? Seus gostos ainda seriam os mesmos? Não importava mais, não havia a menor possibilidade de se encontrarem, ela tinha seus sonhos, suas metas, e ele... Bem, ele já devia estar com outra pessoa, ou iria fazê-la chorar novamente.
A intrigava o fato de ele ter lembrado dela, e mais engraçado e tenebroso era ele ter perguntado se ela havia o esquecido. Por um momento pensou em dizer que não, pensou em pedir para vê-lo e deixar a saudade mostrar qual caminho seguir, mas não, não podia ser fraca novamente, as lágrimas seriam derramadas novamente e não agüentaria outra dor pelo mesmo amor. Deixou-o sem resposta, lhe questionou sobre a finalidade da pergunta, afinal, cinco anos não são cinco dias. Mas ele mudara de assunto, como sempre fugira das respostas complexas. Citou como seus pais estavam e disse que cursava uma faculdade, coisa que ela jamais o imaginaria fazendo. Os pensamentos brincavam com ela, ficava se lembrando da conversa, das risadas com receio, da vontade de tocar seu rosto. Mas reconhecia que não havia como, as coisas mudaram demais e sua razão lhe dizia que não daria certo. Tentou dormir, mas a xícara de café que tomara não a deixou descansar. Tudo constantemente ligado a vontade de ouvir aquela voz de novo, sentir o carinho que um dia ele teve por ela. Foi até seu quarto e resgatou as lembranças daquele amor do passado, as fotos, as cartas, o sapo de pelúcia que havia ganhado de uma viagem que ele fizera, tudo muito bem guardado para que os anos não os estragassem. Podia sentir seu perfume em uma camiseta antiga dele, que guardara com o mesmo carinho que tinha com as suas roupas. Lembrava que nesse dia ele havia a buscado na escola, e levou-lhe a camiseta para ela. Tomaram chuva no meio do caminho, voltaram sorrindo e lembrando-se dos meses que já estavam juntos e pensando nas coisas que estariam por vir. Lia interrompeu a lembrança enxugando as lágrimas que caíram sobre as cartas. Não fazia sentido lembrar-se do que não voltaria. Guardou tudo de novo nas caixas, mas o sapo resolveu deixar sobre a cama. Naquela noite, talvez conseguisse dormir melhor, sabendo que ele ainda pensava nela.
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